Quando vovó nascia, há exatos cem anos, o Distrito de Canoas, entendido erroneamente como Coroas, ainda pertencia à cidade de Prados. Nascia lá pelas bandas da Samambaia, hoje distrito de São Caetano, em Coronel Xavier Chaves. Numa casinha de pau à pique. Tudo muito rústico, tudo muito sofrido, tudo com muita luta. Era filha de Maria Iva Jaques (falecida ainda nova) e de Josué Egídio Jaques (muito querido por todos).
Casada com Pedro 'candiero' (Pedro Paulo era o nome de meu avô), teve nove filhos, sete ainda vivos. Vó faleceu em 15.11.1999, quando uma de suas filhas (minha mãe) completava sessenta anos. Como ouvimos em suas exéquias: há sessenta anos ela nos dava uma vida, hoje entregamos sua vida a Deus. Sim, ela era profundamente religiosa.
Vó Aurora e Vô Pedro, os primeiros do canto esquerdo da foto. |
Eu tinha uma relação muito forte com ela, bastasse uns dias de folga da escola e eu pegava o ônibus rumo à São Caetano, passar alguns dias 'aterrorizando' aquela calmaria. Sim, ao contrário deste Paulo comedido de hoje, fui muito arteiro, na minha infância, sempre questionador, e isso era um despautério aos ouvidos da dona Aurora. Sim, ái de nós se a chamássemos de 'tia', como era o costume do povo da região. Era um desrespeito! Mas, quem ligava para as convenções sociais? Queríamos mais era quebrá-las!
Vó e vô em suas viagens anuais à Aparecida (SP). |
Recordo muito dos dias que passava sozinho com vó, fazendo companhia, naquela solidão do campo e da idade. Quando chegava era festa, durante, era tensão (éramos muito bagunceiros), ao fim era tristeza. Quem não se lembra da carinha dela, na janela, observando a gente se distanciar ao longo da estrada.
Poderia aqui falar dos vários momentos em que passamos juntos, das idas à capela da comunidade, noite afora, somente guiando-nos pela lua. Morria de medo! Lembrar quando ela reunia seus filhos e netos para rezar em torno do fogão à lenha. Lembrar quando ela nos levava para buscar lenha! Sim, eu ia, mas confesso que a enrolava muito! Lembrar da briga que era pra assistir a uma novela global (esse 'mal' do mundo moderno que chegou junto com o sinal da antena parabólica!). Lembrar quando ela nos visitava, em São João del-Rei, com seu balaio (ah, como eu queria uma foto daqueles momentos!), sempre tinha uma surpresa. Lembrar quando ela era Collor e eu, com nove anos, já era Lula! Lembrar do cuidado que ela tinha com os filhos. Lembrar do carinho que ela tinha com o irmão (Tatão), tão querido por todos nós.
Mulher de uma sagacidade ímpar! Impossível resumir sua vida num texto. Cem anos de gratidão!